A Forma aguda do infnito : um estudo sobre o barroco e a Espanha do "siglo de oro" na filosofia de Espinosa
Francisco Guerra Ferraz
TESE
Português
T/UNICAMP F413f
[The acute form of infinity]
Campinas, SP : [s.n.], 2024.
1 recurso online (408 p.) : il., digital, arquivo PDF.
Orientador: Marcio Augusto Damin Custodio
Tese (doutorado) - Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), Instituto de Filosofia e Ciências Humanas
Resumo: Partindo das categorias de época e estilo, esse estudo recupera as formulações de Carl Gebhardt, segundo as quais a filosofia de Espinosa seria uma genuína expressão do Barroco. Procurando avaliar a pertinência dessa hipótese, mostramos que o infinito, desde a obra de Heinrich Wölfflin,...
Ver mais
Resumo: Partindo das categorias de época e estilo, esse estudo recupera as formulações de Carl Gebhardt, segundo as quais a filosofia de Espinosa seria uma genuína expressão do Barroco. Procurando avaliar a pertinência dessa hipótese, mostramos que o infinito, desde a obra de Heinrich Wölfflin, Renaissance und Barock (1888), é identificado com o Barroco por meio do sentimento do sublime provocado pela fruição da monumentalidade dos espaços arquitetônicos. Espinosa é o filósofo que elabora uma metafísica geométrica que reflete a infinita progressão da natureza a partir de uma substância absolutamente infinita, que se expressa por atributos infinitos em seu gênero, dos quais se seguem efeitos infinitos em número infinito de modos. É o filósofo que enxerga o infinito em seus diversos ângulos e graus, e que extrai dele a origem da mente, sua natureza e salvação mediante o aumento de sua perfeição, entendida como a expansão de sua parte eterna e imperecível. O meio hispano-português de Amsterdã onde Espinosa nasceu, vivia a experiência de redescobrir o judaísmo mas simultaneamente reafirmava suas origens portuguesa e espanhola refletida em sua vertiginosa produção literária barroca e nas inúmeras traduções, para o espanhol, de obras da filosofia judaica medieval, como o Guia dos Perplexos de Maimônides. A elite sefardita, ao mesmo tempo que inventava seu judaísmo próprio, reproduzia a formação barroca que recebera nas escolas e universidades católicas da península ibérica, além de difundir na Holanda elementos da Ratio Studiorum da Companhia de Jesus que valorizavam ao máximo o conhecimento das letras, da gramática e das línguas. E na medida em que Espinosa se vincula decisivamente à tradição medieval árabo-judaica ao retomar o infinito atual de Hasdai Crescas inserindo-o no princípio de sua doutrina, acaba por afirmar o elemento cultural apontado por estudiosos como o fator nevrálgico capaz de modificar o Renascimento vindo da península itálica e dar forma ao Barroco na Espanha. Além do mais, o filósofo possuía em sua biblioteca o suprassumo do Barroco literário produzido na Espanha do Siglo de Oro de onde procuramos vestígios materiais e conceituais de algumas dessas obras em sua filosofia. Aplicando as considerações de Agudeza y Arte de Ingenio de Baltasar Gracián às formulações de Espinosa, procuramos detectar procedimentos conceituais e retóricos próprios do Siglo de Oro, como o uso reiterado dos oxímoros. Argumentamos que a própria ideia de uma filosofia cujo modelo é dado por uma metafísica da imanência e pela geometria genética são expressões da agudeza cujo emblema é a produção de uma teoria da verdade nos moldes do contínuo, que recusa qualquer positividade discreta à "forma do erro", expressando assim uma perspectiva inclusiva e cosmopolita conforme à grande expansão da experiência e da racionalidade da época barroca, que extinguem as contradições e as dicotomias absolutas fazendo dos "graus de participação" o centro de gravidade do pensamento. "Tudo é congruente", diz Espinosa a Tschirnhaus. De onde resulta que a ideia de uma Religio Philosophica pode ser pensada como um caso emblemático do contradiscurso quando compreendido, não como resíduo do judaísmo, mas como expressão da agudeza que lê trechos das escrituras e disputa seu sentido atribuindo a determinadas passagens e personagens, conteúdos da doutrina filosófica, visando alcançar corações, mentes e engenhos em distintos graus de compreensão. O que revela também (sob certo aspecto) uma impossibilidade de separação absoluta entre filosofia e teologia, uma vez que, pela apresentação do método histórico crítico e pela existência da elocução religiosa constitutiva do discurso racional (usada com parcimônia, "como o sal", como manda o discurso agudo) e a simultânea valorização do livre exame crítico da Escritura, o filósofo subverte a noção de "intérprete autorizado", deslocando o lugar da teologia e do teólogo ao introduzir a figura do filósofo-filólogo. O que também revela a motivação política do texto e sua interpretação. Por fim, procuramos destacar os "pontos de contato" ou "pontos de excitação", (como na expressão da língua alemã Anregungspunkt) entre Espinosa e alguns autores de sua biblioteca, como Antônio Perez e Francisco de Quevedo. Valorizamos assim as origens e inclinações do filósofo como expressões do barroco (e não de um iluminismo liberal, burguês e cientificista avant la lettre como hoje parece difundido) e de seu pertencimento, em alguma medida, ao acervo cultural ibérico
Ver menos
Abstract: Starting from the categories of epoch and style, this study recovers Carl Gebhardt's formulations, according to which Spinoza's philosophy was a genuine expression of the Baroque. In an attempt to assess the relevance of this hypothesis, we show that the infinite, since Heinrich Wölfflin's...
Ver mais
Abstract: Starting from the categories of epoch and style, this study recovers Carl Gebhardt's formulations, according to which Spinoza's philosophy was a genuine expression of the Baroque. In an attempt to assess the relevance of this hypothesis, we show that the infinite, since Heinrich Wölfflin's work Renaissance und Barock (1888), is identified with the Baroque through the feeling of the sublime provoked by the enjoyment of the monumentality of architectural spaces. Spinoza is the philosopher who elaborates a geometric metaphysics that reflects the infinite progress of nature from an absolutely infinite substance, which is expressed by infinite attributes in its genus, from which infinite effects follow in an infinite number of modes. It is the philosopher who sees the infinite in its various angles and degrees who draws from it the origin of the mind, its nature and salvation through the increase of its perfection, understood as the expansion of its eternal and imperishable part. The Spanish-Portuguese milieu of Amsterdam, where Espinosa was born, was experiencing the rediscovery of Judaism while simultaneously reaffirming its Portuguese and Spanish origins, reflected in its dizzying Baroque literary production and in the countless translations into Spanish of works of medieval Jewish philosophy, such as Maimonides' Guide for the Perplexed. At the same time as inventing their own Judaism, the Sephardic elite reproduced the Baroque education they had received in the Catholic schools and universities of the Iberian Peninsula, as well as spreading elements of the Ratio Studiorum of the Societas Iesu in Holland, which placed the highest value on knowledge of letters, grammar and languages. And insofar as Espinosa is decisively linked to the medieval Arab-Jewish tradition by taking up the actual infinity of Hasdai Crescas and inserting it into the principle of his doctrine, he affirms the cultural element pointed out by scholars as the neuralgic factor capable of modifying the Renaissance from the Italian peninsula and shaping the Baroque in Spain. What's more, the philosopher had in his library the supreme of the literary Baroque produced in Spain in the Siglo de Oro, from which we look for material and conceptual traces of some of these works in his philosophy. Applying the considerations of Baltasar Gracián's Agudeza y Arte de Ingenio to Spinoza's formulations, we try to detect conceptual and rhetorical procedures typical of the Siglo de Oro, such as the repeated use of oxymorons. We argue that the very idea of a philosophy whose model is given by a metaphysics of immanence and genetic geometry are expressions of the agudeza whose emblem is the production of a theory of truth along the lines of the continuum, which refuses any discrete positivity to the ‘form of error’, thus expressing an inclusive and cosmopolitan perspective in line with the great expansion of experience and rationality in the Baroque era, which extinguished contradictions and absolute dichotomies by making ‘degrees of participation’ the centre of gravity of thought. ‘Everything is congruent,’ says Spinoza to Tschirnhaus. As a result, the idea of a Religio Philosophica can be seen as an emblematic case of contra-discourse when understood, not as a residue of Judaism, but as an expression of the agudeza that reads passages of scripture and disputes their meaning by attributing to certain passages and characters the contents of philosophical doctrine, with the aim of reaching hearts, minds and the ingenium at different levels of comprehension. This also reveals the impossibility of an absolute separation between philosophy and theology, since, by presenting the historical-critical method and the existence of religious elocution as part of rational discourse (used sparingly, ‘like salt’, as acute discourse dictates) and simultaneously valuing the free critical examination of Scripture, the philosopher subverts the notion of the ‘authorised interpreter’, displacing the place of theology and the theologian by introducing the figure of the philosopher-philologist. This also reveals the political motivation of the text and its interpretation. Finally, we try to highlight the ‘points of contact’ or ‘points of excitement’ (as in the German expression Anregungspunkt) between Spinoza and some of the authors in his library, such as Antonio Perez and Francisco de Quevedo. In this way, we value the philosopher's origins and inclinations as expressions of the Baroque (and not of a liberal, bourgeois and scientific Enlightenment avant la lettre, as seems widespread today) and of his belonging, to some extent, to the Iberian cultural heritage
Ver menos
Aberto
Custódio, Márcio Augusto Damin, 1970-
Orientador
Évora, Fátima Regina Rodrigues, 1958-
Avaliador
Levy, Lia
Avaliador
Domingues, Ivan
Avaliador
A Forma aguda do infnito : um estudo sobre o barroco e a Espanha do "siglo de oro" na filosofia de Espinosa
Francisco Guerra Ferraz
A Forma aguda do infnito : um estudo sobre o barroco e a Espanha do "siglo de oro" na filosofia de Espinosa
Francisco Guerra Ferraz