Resumo: Esta tese analisa a forma pela qual o arcabouço teórico weberiano é apropriado em trabalhos de Raymundo Faoro e de Maria Sylvia de Carvalho Franco para pensar aspectos da modernização da sociedade brasileira. Para os dois autores, a adequada compreensão dos marcadores das diferenças sociais e das formas de dominação a eles associadas permite descortinar importantes elementos que fundamentam as relações de poder e as bases sociais do Estado. Assim, tendo Max Weber como uma importante – mas não exclusiva – mediação teórica, a leitura cruzada das obras de ambos torna possível elucidar como os textos, temas e conceitos weberianos apropriados – e, igualmente, aqueles escanteados – fazem emergir uma visão particular sobre o conjunto da produção de Weber, por um lado; e apontam para um amplo circuito de produção e circulação de ideias que se inspira, adere, recusa e modifica um corpo teórico para interpretar aspectos da modernidade e do processo de modernização, numa dinâmica que acaba por alargar o próprio conceito de modernidade, por outro. Sinteticamente, a forma seletiva de apropriação do aparato weberiano impacta significativamente no tipo de interpretação produzida. Para tanto, tomamos como objetos centrais as duas edições de Os Donos do Poder (publicadas em 1958 e – revista e ampliada – em 1975), de Raymundo Faoro, e o estudo sobre os Homens livres na ordem escravocrata (apresentado como tese de doutorado em 1964 e publicado como livro em 1969) de Maria Sylvia de Carvalho Franco. Buscamos situar as obras no conjunto da produção dos autores e colocá-las em diálogo com o momento histórico em que foram produzidas. Os dois autores retomam problemas sobre patriarcalismo e patrimonialismo que encontram espaço para serem desenvolvidos a partir de uma análise fundada nas categorias da sociologia weberiana da dominação – num sentido estrito, no estudo da organização do Estado partindo da tipologia da dominação legítima; de modo mais abrangente, na compreensão das relações sociais tendo em vista a capacidade de se fazer cumprir um mandato. Nesse sentido, Faoro concentra seus esforços na compreensão da gênese e na persistência de uma forma de dominação estamental-patrimonial, que – de modo bastante resiliente – se amolda a diferentes configurações históricas de Estado. Carvalho Franco, a seu turno, propõe uma análise histórica do ciclo do café no século XIX para pensar o modo pelo qual se institui uma forma específica de dominação que difere conceitualmente tanto da dominação tradicional quanto da noção de interesses de classe. Assim, nas relações que se estabelecem entre fazendeiros e homens livres e expropriados constituem-se um padrão de dominação pessoal Ver menos

Abstract: This thesis analyzes the manner by which the Weberian theoretical framework is applicable in the works of Raymundo Faoro and Maria Sylvia de Carvalho Franco to reflect on aspects of the modernization of Brazilian society. For the two authors, the adequate understanding of the markers of social differences and the forms of domination associated with them allows the unveiling of important elements that underlie the power relations and the social foundations of the State. Therefore, with Max Weber as an important – but not exclusive – theorical mediation, the cross reading of the work of both authors makes it possible to enlighten how they appropriate Weberian writings, themes and concepts – and, likewise, those disregarded – to bring out a particular vision on Weber’s body of work; and point to a broad circuit of production and circulation of ideas which inspires, adheres, refuses and changes a theoretical framework in order to expound aspects of modernity and the process of modernization, in a dynamic which results in a broadening of the very own concept of modernity. In summary, the selective appropriation of the Weberian apparatus has a meaningful impact on the kind of interpretation produced. For this purpose, we take for central objects Raymundo Faoro’s two editions of Os Donos do Poder (published in 1958 and – reviewed and expanded – in 1975), and Maria Sylvia de Carvalho Franco’s Homens livres na ordem escravocrata (presented as her doctorate’s thesis in 1964 and published as a book in 1969). We intend to situate the works within the the authors’ oeuvre and to converse with the historical moment in which they were produced. The two authors resume problems of patriarchalism and patrimonialism and advance them based on an analysis founded on the categories of Weber's sociology of domination - in a strict sense, in the study of the organization of the State starting from the typology of legitimate domination; in a more comprehensive way, in the understanding of social relations, observing the ability to mandate. In this sense, Faoro focuses his efforts on understanding the genesis and persistence of a form of estate-patrimonial domination, which – in a very resilient way – conforms to different historical configurations of the State. Carvalho Franco, in turn, proposes a historical analysis of the coffee plantation era in the 19th century, in order to untangle the way a specific form of domination is instituted which conceptually differs both from traditional domination and from the notion of class interests. Thus, in the relationships that are established between landowners and free and expropriated men, a pattern of personal domination is constituted Ver menos