Resumo: Esta tese descreve uma trajetória que vai de uma análise dos fluxos desejantes dos textos curtos de Flusser à proposição de uma filosofia descolonial da técnica. Ela realizou uma leitura literária (e não retórica) da filosofia interessada no fluxo desejante do texto. Leu os textos pelas entrelinhas, friccionando-os em seus espaços em branco, atravessando-os e recortando-os por entre parágrafos, seções e sinais gráficos, inserindo e fazendo vibrar próteses em busca de seus não-ditos e silêncios. A tese consistiu em dizer que Flusser, seu corpus, a filosofia do exílio flusseriana, opera de maneira paidêutica entre a descolonialidade e a filosofia da técnica, apontando para sua (des)operação mútua. Embora Flusser não use o termo descolonial e talvez até se ressentisse de seu uso, isso significa que os mecanismos e conteúdos da filosofia do exílio de Flusser – como destinação e destinerração, a variação de pontos de vista e a desprogramação dos programas do aparato que considera o lugar como uma mídia a ser desenraizada a cada vez por conformar e limitar o pensamento – apontam para a possibilidade de encontrar soluções para um desafiante confronto desprogramatizante da filosofia da técnica e da prática da descolonialidade uma pela outra. Esta tese quer justamente colocar em jogo e levar às últimas consequências o Flusser dos brasilianistas, o Flusser "engajado" na cultura brasileira, mas também o Flusser que tem as cidades como conceito-índice nodal de seu pensamento, o Flusser que pensa sobre o nomadismo, sobre a situação ou condição material-midiática-(local) do pensamento, e o Flusser que pensa a técnica, a tecnicoimagem, as mídias, a comunicação, os gestos. Em vez de separar esses Flussers já consolidados nos estudos flusserianos, era preciso fazer comum com o outro, (des)programando um pelo outro. E isso fez com que encontrássemos ainda outro Flusser, talvez ainda mais "visionário", contemporâneo, ou extemporâneo, um Flusser que a gente pode destinerrar e (des)operar como totem para uma filosofia vindoura, para uma filosofia descolonial da técnica. Esta tese quer figurar, assim, como uma contribuição para a elaboração de uma crítica descolonial e antirracista das práticas filosóficas nestas terras. Não faz isso elegendo Flusser como modelo dessa crítica, mas por três vias: a) a diacrônica, em que analisa sua obra e a compara historicamente, com suas limitações, imperfeições, horizontes de expectativa e (im)possibilidades; b) percebendo em sua prática filosófica elementos não realizados que ficaram perdidos na história e que podem contribuir hoje para o exercício dessa crítica descolonial antirracista; e c) a sincrônica, que atravessa esse corpus pelas demandas e urgências do presente Ver menos

Abstract: This thesis described a trajectory from an analysis of Flusser's short texts to the conclusion of the thesis' suggestion of a decolonial philosophy of technology. It performed a literary (and not rhetorical) reading of philosophy concerned with the desirous flow of the text. The aim was to read the texts between lines, rubbing them in their blank spaces, crossing and cutting them out between paragraphs, sections, and graphic signs, inserting and vibrating prosthesis in search of its unspoken and silences. The underlying argument here states that Flusser, his corpus, the Flusserian philosophy of exile, is at play between decoloniality and the philosophy of technology, making their mutual de-operation. Although Flusser does not use the term decolonial and perhaps even disliked it, nonetheless it is true that the mechanisms and contents of Flusser's philosophy of exile - such as the shifting of perspectives, and the deprogramming of the programs of the apparatus that considers place as a media to be uprooted at any time for constraining and limiting thought - suggest the possibility of addressing a provocative deprogramming confrontation of the philosophy of technology and the practice of decoloniality with each other. This dissertation intends to bring into play and lead to the utmost limits the Flusser of the Brazilianists, the Flusser "engaged" in Brazilian culture, but also the Flusser that has cities as a nodal index-concept of his thought, the Flusser that thinks about nomadism, about the situation or material-media-(local) circumstance of thought, and the Flusser that thinks about technology, techno-image, media, communication, gestures. Instead of separating these Flussers that were already established in Flusserian studies, it was necessary to make with each other, (de)programming one through the other. This assumption discovered a Flusser who is perhaps even more "visionary", contemporary, or extemporaneous, a Flusser that one can use as a totem for a coming philosophy, for a decolonial philosophy of technology. This thesis wants to be, therefore, a contribution to the elaboration of a decolonial and anti-racist criticism of philosophical practices. It doesn't achieve this by choosing Flusser as a model of this criticism, but rather through three paths: a) the diachronic, in which it analyzes his work and compares it historically, with its limitations, imperfections, horizons of expectation, and (im)possibilities; b) observing in his philosophical practice unfulfilled elements that were lost in history and that can contribute today to the exercise of this decolonial anti-racist criticism; and c) the synchronic, which crosses this corpus according to the demands and urgencies of the present Ver menos